Delegação de tarefas a terceiros e responsabilização do empresário por crimes contra a ordem tributária

INTRODUÇÃO

A maioria das empresas que começaram suas atividades do zero e que foram crescendo ao longo do tempo têm em comum uma característica importante: a delegação de tarefas.

De forma resumida, podemos dizer que o ato de delegar tarefas é um processo que tem por objetivo transferir tarefas operacionais e, até mesmo, mais simples para outras pessoas.

Graças à delegação de tarefas permite-se que os empresários foquem mais na gestão do seu negócio do que na própria execução.

De acordo com o SEBRAE há alguns principais benefícios decorrentes da delegação de tarefas: 1) o maior foco nas questões estratégicas da empresa; 2) eliminação de potenciais erros; 3) aprimoramento da competência da equipe de trabalho; 4) possibilidade de estudar sobre o negócio; e, 5) aproveitamento do networking. (Fonte: https://sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/pe/artigos/por-que-a-delegacao-de-tarefas-e-importante-para-o-negocio-entenda,65325b5c7bac7710VgnVCM100000d701210aRCRD )

Apesar de muitos empresários ainda ficarem reticentes na hora de delegar tarefas, seja por medo de seus colaboradores não serem capazes de realizar as atividades com o mesmo grau de qualidade que o empresário ou seus sócios executam, a delegação é garantia de expansão da empresa e, com boas doses de treinamentos e reciclagem, conhecendo as equipes de perto e escolhendo muito bem as tarefas que serão delegadas, sempre acompanhando e dando feedback aos colaboradores, a delegação ocorrerá de forma usual e necessária à evolução dos negócios.

O assunto da delegação, contudo, também é matéria de limites na responsabilização penal tributária, conforme resumidamente trataremos a seguir.

DELEGAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO EMPRESÁRIO NOS CRIMES TRIBUTÁRIOS

Para o STJ, nos crimes tributários, a delegação de tarefas não impõe, obrigatoriamente, a responsabilização penal e participação do empresário como coautor do delito.

De acordo com jurisprudência sedimentada da 6a Turma do STJ, alguns empresários foram absolvidos de crime contra a ordem tributária por terem contratado terceiros para delegar questões tributárias, e, com isso, não devem ser acusados pela prática do crime de sonegação fiscal.

O referido tribunal, especialmente em alguns votos relatados pelo Ministro Rogério Schietti Cruz, destacam que não há como considerar, com base na teoria do domínio do fato, que a posição do gestor, diretor, ou sócio administrador de uma empresa implica a presunção de que houve participação no delito, se não houver no plano ou fático probatório alguma circunstância que vincule à prática delitiva.

Assim, ao assumir a propriedade de determinada empresa em virtude de situações emergenciais ou excepcionais, tais como: sucessão de herdeiros, súbito falecimento de seu cônjuge, somadas à pouca experiência demonstrada por aquele que assumiu a propriedade da empresa, se houve a necessária delegação das questões tributárias aos gerentes com conhecimento técnico especializado, bem como a empresas de consultorias, não há que se falar em participação criminosa do empresário caso haja algum crime de sonegação fiscal por fraude exclusiva dos responsáveis por gerir a condução delegada.

Assim, não se aplica a chamada teoria do domínio do fato automaticamente nos casos de delegação de tarefas tributárias na empresa, máximo porque, neste plano, não há descrição de nenhuma circunstância que implique o nexo de causalidade, o qual não pode ser presumido.

 

JURISPRUDÊNCIA E RESPONSABILIDADE PENAL TRIBUTÁRIA DO SÓCIO QUE DELEGOU FUNÇÕES TRIBUTÁRIAS

A 6a turma do STJ tem importante precedente firmado no Processo: REsp 1.854.893 que garante esse entendimento de não responsabilização automática do empresário por crimes tributários em caso de delegação de tarefas na empresa, veja-se: “o delito de sonegação fiscal exige para sua configuração que a conduta seja dolosa consistente na utilização do procedimento fraude que violem de forma direta a lei ou o regulamento fiscal, no qual o contribuinte age com o objetivo de favorecer a si ou a terceiro por meio da sonegação.” (Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/333051/stj-absolve-empresaria-do-crime-contra-ordem-tributaria-ja-que-delegava-tarefas-a-terceiros )

Não há como considerar que a posição de gestor, diretor ou sócio administrador de uma empresa implique a presunção de que houve participação em fraude tributária se não houver, no plano fático-probatório, alguma circunstância que o vincule ao delito, ao arrepio de alguns magistrados e promotores de primeira instância que ainda insistem em aplicar a teoria do domínio do fato, que abre a possibilidade de responsabilizar penalmente um acusado com base em sua graduação hierárquica. O ministro Rogério Schietti já endossou no âmbito do Superior Tribunal de Justiça que essa teoria de origem alemã opera em um plano de abstração e funciona como razão de decidir, de forma que é insuficiente por si mesma para confirmar a existência de nexo de causalidade entre o crime tributário e o agir do empresário(a). (Fonte: https://www.conjur.com.br/2020-set-08/dolo-posicao-socio-nao-basta-crime-tributario )

O delito de sonegação fiscal previsto no artigo 1º do inciso II da Lei 8.137/90 exige conduta dolosa de fraude para violar diretamente lei ou regulamento fiscal, com objetivo de favorecer a si ou a terceiro, de forma que entendemos, assim como a 6a Turma do STJ que há uma diferença inquestionável entre aquele que não paga tributo “por circunstâncias alheias à sua vontade — por dificuldades financeiras ou outras questões” — e aquele empresário que age com vontade e consciência (dolo) para sonegar o tributo valendo-se de meios espúrios e motivados por interesses exclusivamente fraudulentos e pessoais.

 

Por Rafhaella Cardoso Advocacia

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